Sócios Anônimos Ltda., ideias para um novo ambiente de negócios no Brasil

Você não precisa ler todo esse ensaio para compreender o que pretendo sugerir: leis que facilitem as formalidades de sócios “especiais”, que possam entrar e sair sem muita burocracia do contrato social de empresas de capital fechado. Os principais exemplos que sugiro são:

·  Sociedade com locador;

·  Sociedade com funcionário (colaborador).

Com a esperança de retomada do crescimento do PIB amparada em uma postura francamente liberal do novo governo, o objetivo aqui é colaborar para a discussão quanto a inovar para facilitar a forma de fazer negócios no Brasil.

Introdução à análise de desempenho e risco do negócio

Negócios são operações de altíssimo risco, pois ninguém é capaz de garantir que haverá, de forma contínua, um nível de faturamento que cubra os custos e ainda sobre um resultado satisfatório. O objetivo da criação de um negócio é a obtenção de lucro, um rendimento que seja superior às aplicações financeiras comuns (tipo poupança), a um nível que compense o esforço e o alto risco de insucesso.

Observe a estrutura do resultado de uma empresa de varejo (no exemplo um supermercado fictício, com números parecidos com os do setor), apresentado mais ou menos da seguinte forma:

Repare que, embora a empresa do exemplo tenha precificado em duas vezes e meia o valor do custo de suas mercadorias ($703.672/$281.469), é preciso que haja um volume tal de vendas cujo “resultado bruto”(RB)  seja suficiente para pagar os custos fixos, aqui denominados de “despesas operacionais” (DO), da ordem de $235.592. Admitamos que estes preços médios estão no nível mais alto possível para que não espantem a clientela para os braços do concorrente. E, sim, espante-se com o lucro de apenas 3% ao final de um mês inteiro de riscos, muitas preocupações e trabalho…

(Entre esses custos “fixos” (DO) podemos dizer que uma pequena parcela varia de acordo com o nível de atividades, como por exemplo as horas extras, algumas ações de marketing, perda com estoques perecíveis etc., mas para efeito didático consideraremos irrelevante essa variabilidade.)

Com essas premissas podemos deduzir que, para que haja algum lucro (ainda que baixo e depois venha a ser tributado pelo sócio-Estado, via IRPJ e CSLL, ou seja, o LAIRCS), é preciso que as vendas sejam iguais ou superiores ao resultado bruto, cujo limite inferior é DO = RB. Logo, neste caso o ponto de equilíbrio (break-even point) é de $235.592 divididos por 37% (percentual de margem bruta), o que resulta em $632.752.

O ponto de equilíbrio informa ao empresário o patamar limite de vendas abaixo do qual não terá absolutamente nenhum lucro, que apenas faturará o suficiente para garantir o pagamento de suas contas (incluindo-se salários e aluguel). No exemplo o mercadinho precisa vender em torno de $632.752, ou seja, precisa atingir a substancial marca de 19.898 operações mensais – no caso com um ticket médio de R$31,80 -, nas suas caixas registradoras. Não é fácil ser empresário!

Da análise do desafio

Desde os primórdios do empreendedorismo vive-se o conflito entre trabalho e capital. Um lado está sempre achando que o outro possui vantagens acima do razoável, sendo difícil um equilíbrio harmonioso entre interesses e expectativas, muito em virtude da incompreensão do que significa empreender. Não percebem que na verdade são todos – empresários, funcionários, fornecedores etc. -, parceiros de negócios. Mas o mais importante a compreender é que sem lucro não há empresa, e sem empresa não há empregos nem circulação de riquezas.

Na crise em que vivemos no Brasil observo que, por não dispor de experiência ou qualificação técnica, o cidadão comum (inclusive jornalistas) tem muita dificuldade de perceber e assimilar que um negócio só obtém resultado positivo a partir de certo patamar de vendas. E ainda, que essas vendas precisam conter uma margem positiva entre o custo de compra e o preço de vendas, também sob certo patamar. O resultado bruto deriva, portanto, do binômio {volume + margem}. Logo, quando as vendas estão abaixo desse nível, o fluxo de caixa da operação torna-se deficitário e o gestor desavisado se apressa em cobrir a diferença apenas protelando decisões importantes, tomando empréstimos e postergando dívidas.

O correto é dispor de um gestor com o preparo técnico necessário para analisar e compreender o que está acontecendo na operação a ponto de definir claramente se há chance de retomar o equilíbrio das contas ou não. Infelizmente não encontramos esse profissional com facilidade.

Os negócios, especialmente os de varejo, são muito sensíveis ao humor do consumidor, com margens estreitas pela competição e resultados ínfimos diante da carga fiscal brasileira. Todo o desafio basilar da gestão deve ser equacionado com estrutura técnica e profissional para monitorar apropriadamente o resultado e a liquidez das empresas, de forma a identificar cenários complexos e agir por antecipação. Essa é a ladainha que dissemino desde que criei a minha empresa de (re)estruturação de negócios.

Da ideia

Ocorre que ainda que uma operação possa ser bem gerida, o ambiente de negócios no Brasil pode deixar de joelhos qualquer “gênio” administrativo. Os custos com carga tributária e trabalhista são insuportáveis. E, para piorar, basta somar à batalha do varejista um período de fortes chuvas e alagamentos, ou o entrave de uma greve de caminhoneiros e veremos graves danos no faturamento, causando prejuízos irrecuperáveis à operação. Todo dia é uma batalha por vendas em níveis saudáveis.

Quando em crise, o empresário tem no seu cotidiano a desgastante negociação com aqueles a quem deve. Sem maiores análises, aposta em um futuro melhor ou milagroso, e continua tomando créditos de bancos, depois do fisco (deixando de pagar impostos), depois atrasa aluguéis, fornecedores, folha etc. Segue devendo cada vez mais, atolando-se em juros e multas.

Minha ideia original, como disse, é fácil de entender. Basicamente foi imaginada para inovar na forma de desenvolver novos negócios. Talvez seja uma tanto difícil adaptá-la para empresas que já estejam em crise, mas não descarto o seu uso para empresas saudáveis já existentes.

Sendo salários (e seus encargos) e os aluguéis dos imóveis, especialmente os comerciais (lojas), uma parte muito relevante do resultado das empresas, inferior basicamente apenas aos custos dos estoques e dos impostos, por que não torná-los sócios? Por que, por exemplo, não oferecer ao locador que está com dificuldade de alugar seu imóvel e tem um pouco mais de apetite para risco, uma parcela do lucro da operação? Por que, também por exemplo, não oferecer o mesmo a um profissional que esteja igualmente disposto a correr algum risco?

Em operações comerciais podemos encontrar aluguéis cuja relevância atinge em torno de 10% do faturamento, o que é desastroso. Da mesma forma todos sabemos de quão cara é a folha de salários e suas complicações.

Em um negócio somente o empreendedor corre riscos. Talvez seja a hora de ampliarmos essa possibilidade a outros dependentes e parceiros da operação.

Dos obstáculos à ideia

A boa governança exige o cálculo preciso do resultado (lucros e perdas) nas empresas, mas infelizmente conto nas mãos dos dedos as que conseguem levar isso a sério, independentemente do porte. O caro leitor ficaria assustado se lhes dissesse, o que não farei, o grau de imprecisão na apuração de resultados em empresas que faturam milhões, centenas de milhões, bilhões de reais por ano.

O problema que reparo mais comumente nas empresas menores, é uma confusão técnica entre os regimes de caixa e competência, pois para alguém não treinado em registro contábil, a diferença pode ser mesmo sutil. Isso precisa ser resolvido se um empresário pretende obter a confiança de novos sócios, o que não depende de nova legislação.

Outro problema é a relevância e o nível de complexidade de impostos em novos negócios. Há muitos anos já rogo pelo conceito do imposto pós pay-back. 

(Ver https://reestruturador.blogspot.com/2018/11/imposto-pos-payback-um-forte-estimulo.html.)

Resolvidos os desafios já mencionados, resta um grave problema burocrático para o empreendimento que ainda não tem tamanho para atuar na bolsa de valores. Atualmente, a entrada e saída de sócios numa empresa limitada, de capital fechado, demanda, a cada movimentação, a assinatura e a ida de todos os quotistas ao cartório, o que é uma burocracia quase intransponível quando se tem muitos sócios. Burocracia que inexiste nas companhias abertas (companhias negociadas em bolsas de valores). Em um mundo cada vez mais digital, com o desenvolvimento da tecnologia de registros confiáveis tipo blockchain, temos a possibilidade de fazer funcionar com agilidade e segurança a ideia de tornar mais amplo o comprometimento de parceiros e colaboradores, como sócios, para o sucesso de um empreendimento.

Sobra ao empreendedor mostrar governança, capacidade de negociação e de organização. Um ótimo exercício para quem pretende crescer, expandir e, quem sabe, um dia vir a participar do sofisticado jogo dos bancos e fundos de investimento e das bolsas de valores.

Ricardo Negreiros – Engenheiro Civil, Contador e MBA em Finanças

Juliana Fidêncio

juliana@ceger.com.br

Postado: 03/08/2019

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